sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Sílvia Rebelo esteve “À Conversa com Carla Couto”


Falta apostar mais no futebol feminino,

Sílvia Rebelo esteve “À Conversa com Carla Couto”.
A internacional portuguesa Sílvia Rebelo defende uma maior aposta no futebol feminino e apela a uma mudança de mentalidades das jogadoras nacionais. “À Conversa com Carla Couto”, a futebolista de 25 anos, que representa a Fundação D. Laura Santos, sonha representar Portugal numa fase final de um Europeu ou Mundial e admite que gostaria de jogar no campeonato alemão.

Carla Couto (CC): Quando nasceu o gosto pelo futebol?
Sílvia Rebelo (SR): Desde muito cedo, quando estava na escola a minha turma era basicamente constituída por rapazes e eu jogava sempre com eles. Foi a partir daí.
CC: Como surgiu a oportunidade de rumares à Fundação D. Laura Santos?
SR: Comecei a jogar num clube em Gouveia, mas ainda não havia campeonato, era só à base de encontros e não era competitivo. Estive um ano nessa equipa e depois surgiu a Fundação Laura Santos, que conhecia a minha situação. Sabia que era um clube que apostava no futebol feminino e convidaram-me para integrar a equipa de uma forma mais séria e organizada.
CC: E quando optaste pelo futebol, como foi a receptividade dos teus pais e amigos?
SR: Aceitaram bem porque [os meus amigos] jogavam na escola e eles incentivavam-me. Eu nunca tive essa oportunidade, mas sei de colegas minhas que fizeram a formação num clube de rapazes e eles estavam sempre a “chatear-me” para ir e apoiaram-me desde o início, tanto os meus pais como os meus amigos.
CC: Há quantos anos estás na Fundação?
SR: Há 12 anos.
CC: Nunca pensaste em dar o salto, em sair?
SR: Sinceramente, não.
CC: O que fazes para além do futebol?
SR: Trabalho na Fundação D. Laura Santos como auxiliar num lar de idosos, especificamente na Albergaria.
CC: Como é conciliar o futebol com o trabalho?
SR: É fácil porque o facto de a equipa pertencer ao local de trabalho ajuda um pouco. Se calhar, se trabalhasse fora da Fundação também seria. Quando há força de vontade, consegue-se conciliar tudo.
CC: E sendo uma jogadora de Selecção, quando há estágios, o teu clube é acessível?
SR: Normalmente agendava férias, mas agora há a questão de a Federação reembolsar a instituição pela cedência das jogadoras e por isso nunca tive problemas em treinar.
CC: O que significa para ti jogar na Selecção Nacional?
SR: Para além de ser um orgulho, penso que só quem está sabe o que nós sentimos quando vestimos a camisola, ouvimos o hino, mas julgo que é essencialmente a recompensa de todo o trabalho. Sabemos que para chegarmos lá temos de trabalhar muito mais do que no clube e há sempre um objectivo a cumprir. Queremos jogar ao domingo, ganhar sempre, mas o facto de irmos à Selecção é muito mais do que isso. Tem de haver muito mais trabalho e sacrifício e nesse sentido é um orgulho chegar o dia da convocatória e vermos lá o nosso nome.
CC: Qual foi o momento mais marcante, pela positiva, que viveste na carreira até ao momento?
SR: A primeira vez que o Laura Santos subiu ao Nacional Feminino e a primeira internacionalização.
CC: E o pior momento que viveste até hoje?
SR: Foi em 2012, quando tive uma lesão grave no joelho, ao serviço da Selecção Nacional, no Brasil.
CC: Neste momento, estás a jogar. Como foram esses meses de recuperação e de luta?
SR: Foram difíceis mas tive sempre uma equipa excelente a apoiar-me, as minhas colegas, inclusivamente da Selecção, foram fantásticas nesse aspecto, o que facilitou o trabalho.
CC: Foram quantos meses de paragem?
SR: Nove meses. Mas estive mais tempo sem poder jogar devido ao final da época. Só regressei aos relvados na temporada seguinte.
CC: Quando foi a tua primeira internacionalização?
SR: Em 2009.

CC: Desde que foste chamada à Selecção até hoje, que evoluções e situações positivas tens visto no futebol feminino português?
SR: A evolução nota-se muito bem, até porque o facto de haver uma maior aposta no futebol feminino ajuda a esse crescimento. Lembro-me que na altura em que fui à Selecção sub-19, a maior parte das jogadoras estavam nos campeonatos distritais e praticavam futsal. Agora vemos as Selecções sub-17 e sub-19 e temos jogadoras que actuam no estrangeiro, que estão no Campeonato Nacional, o que torna a Selecção muito mais competitiva. As futebolistas são obrigadas a evoluir mais rapidamente do que quando eu estava na formação. Naquele tempo podíamos jogar futebol de sete a nível distrital e o campeonato não era nada competitivo, nós chegávamos a ganhar 30-0 e depois íamos à Selecção e notava-se uma grande diferença. Penso que agora ainda há muito para evoluir mas já conseguimos combater algumas adversidades e estamos a trabalhar para isso. Ainda não conseguimos enfrentar as grandes selecções olhos nos olhos, mas já vamos com outra mentalidade. Antes dizíamos que o objectivo era perder pelo menor número de golos possível e não atacávamos e agora talvez já não seja bem assim.
CC: O que falta para Portugal atingir os patamares dessas selecções teoricamente mais fortes?
SR: Falta apostar ainda mais no futebol feminino. Apesar da evolução, ainda se aposta muito pouco e acho que a mentalidade das jogadoras também deve mudar, porque às vezes não se valorizam o suficiente. Têm de pensar que são capazes e que vão trabalhar mais. Não devem julgar que o facto de as futebolistas das outras selecções treinarem quatro ou cinco vezes por semana, e nós só treinarmos duas, é um factor de maior fragilidade. Creio que essa mentalidade tem de mudar um pouco.
CC: És da opinião de que a jogadora portuguesa não se compromete muito com a modalidade?
SR: Sim, porque há jogadoras que se calhar têm a ambição de ir à Selecção mas outras não têm. Ou seja, sabem que podem ir mas só o facto de terem de trabalhar duas, três vezes fora do clube faz com que já não lutem por isso. Elas dizem que há um sonho, mas na realidade não lidam com ele.
CC: Qual é o teu sonho?
SR: Jogar num Campeonato da Europa ou do Mundo, pela Selecção Nacional.
CC: Que clube gostarias de representar? Há algum campeonato em que tenhas a ambição de participar?
SR: Não me importava de experimentar o campeonato alemão, mas sinceramente nunca tive a iniciativa de sair. Na minha opinião, as pessoas têm de se sentir bem onde estão e neste momento sinto-me bem no Laura Santos e, por isso, ainda não pensei na saída.
CC: Qual é o teu maior objectivo enquanto jogadora? Até onde gostavas de chegar?
SR: O meu objectivo é ir à Selecção e manter o ritmo. No clube quero dar o meu exemplo às minhas colegas de equipa e mostrar que quando queremos e trabalhamos as coisas saem naturalmente e somos recompensadas pelo trabalho.
CC: Como vês o trabalho que o Sindicato tem feito em prol do futebol feminino?
SR: Penso que é, sem dúvida, uma mais-valia porque não tem sido dado o devido valor ao futebol feminino, especialmente se o compararmos com o masculino. O Sindicato está a tentar mostrar que as coisas não são bem assim e que se pode inverter a situação.
CC: Quando terminares a tua carreira de futebolista, o que gostarias de fazer? Esperas continuar ligada ao futebol?
SR: Sim. Acho que depois de tantos anos é impensável deixar de jogar futebol e não ficar ligada à modalidade, por isso quero continuar, em princípio, a dar formação nas camadas jovens.
CC: E tens acesso a essa formação? Pensas tirar um curso de treinadora?
SR: Sim.
CC: Para ti, o que é o futebol?
SR: Há coisas que não se explicam, sentem-se. É uma paixão e é um gosto que tem de nascer connosco. Uma coisa é dizer que gosto de futebol, trabalhar, fazer sacrifícios, abdicar de certas coisas. Por exemplo, hoje vou jantar com a minha mãe mas tenho treino. Sei que tenho de abdicar do jantar para ir ao treino se é que tenho gosto pelo futebol, sair com os amigos não posso porque ainda tenho jogo, por isso tem de ser mesmo uma paixão.
CC: Como vês o sucesso das tuas colegas lá fora [casos de Ana Borges e Cláudia Neto]? Sendo uma jogadora que partilha dias de estágio na Selecção, como vês a saída delas para o estrangeiro e o sucesso que têm tido nos seus clubes?
SR: É gratificante, principalmente a Ana Borges. Desde pequenina que ela começou a jogar comigo na Fundação, por isso sempre que sai uma notícia dela ou da Cláudia, penso que é a mesma coisa do que se fosse eu a ter sucesso. Afinal somos uma família, fazemos todas parte do mesmo grupo, por isso se elas têm sucesso, o futebol feminino tem sucesso.
CC: A tua irmã também joga na Fundação. O que sentes ao veres a tua irmã a jogar contigo?
SR: Penso que lhe peguei o bichinho, por isso tento ser sempre um exemplo para ela e dizer-lhe que pode chegar mais longe. Eu, por exemplo, não tinha a Selecção como uma prioridade ao início, mas depois com o trabalho fui percebendo que se quisermos, alcançamos tudo e é isso que eu lhe transmito. E também digo isso às minhas colegas, como é óbvio.
CC: O que dirias às meninas que vão ler a tua entrevista e que gostavam de praticar futebol, mas ainda não praticam?
SR: Se realmente gostam de futebol, lutem porque não é fácil. Há dias menos bons e às vezes o mais fácil é desistir, mas na verdade quando corremos por gosto não nos cansamos. Por isso, se elas realmente gostam, aconselho-as a lutarem por todos os sonhos, porque se não for hoje, elas vão concretizá-los amanhã.
Perfil
Nome: Sílvia Marisa Garcia Rebelo
Local e Data de Nascimento: Gouveia, 25 de Maio de 1989
Profissão: Trabalhadora auxiliar
Clube: Fundação Dona Laura dos Santos
Posição: Defesa central
Ano em que começou a jogar futebol: 2001
Internacionalizações AA: 40
In http://sjpf.pt/

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